My most recent paintings feature elements commonly regarded as natural, yet they are not landscape paintings. This genre of painting emerged in art history alongside colonial enterprises and was characterized by a deliberate separation of humans from the natural world. I therefore consider these paintings as anti-landscapes, as they offer an intimate, close-up perspective, suppressing the vast space or retreat necessary for constructing a landscape.
In these images, there is a kind of visual confusion if we approach them through the dynamics of recognition and isolation of the different elements that compose a scene, based on Cartesian space. The images I am drawn to do not rely on recognizing the contour of an individual, which also leads me to regard them as anti-portraits. By presenting these non-human subjects through a close and collective gaze – focusing on multiplicity and groups rather than the Western perspective that structures both portrait and landscape, rooted in distance and segmentation – these paintings shift the emphasis from the individual to the relational. This alteration changes our scale of perceiving reality. After all, it is impossible to think about the world, climate, or science without considering a relational field in which everything communicates, interacts, and mutually influences one another.
I recall a silent yet revealing moment that led me to create one of my first paintings. Upon opening the refrigerator and finding some fruits gathered on a plate, I suddenly felt as though I had interrupted a conversation. I also remember creating a series of poems and watercolors that ascribed moods and feelings to fruits and other objects.
Years later, I realized this recurring thread in my work: although I work with a visual language, I am drawn to what is invisible within what I see – the flavors, aromas, textures, and an immaterial dimension akin to what we call “soul.” This animist relationship with the world challenges the rigid separation between subject and object that underpins much of modern science and lies at the root of an extractive relationship with the natural world. Through painting, I aim to construct a symmetry in which the beings represented can present themselves as subjects, inspired by the knowledge of Indigenous peoples and the thoughts of figures such as Antônio Bispo dos Santos, Eduardo Viveiros de Castro, Bruno Latour, Isabelle Stengers, and Philippe Descola.
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Minhas pinturas mais recentes apresentam elementos considerados naturais, mas não se configuram como pinturas de paisagem. Este gênero da pintura se estabeleceu na história da arte contemporaneamente à empresa colonial e se caracterizou por uma tomada de distância do humano em relação ao mundo natural. Considero, portanto, essas pinturas como antipaisagens, uma vez que apresentam uma visão muito aproximada das coisas, suprimindo o amplo espaço ou recuo necessários à construção da paisagem.
Nessas imagens há uma espécie de confusão visual, caso tomemos a visão a partir da dinâmica de reconhecimento e isolamento dos diferentes elementos que compõem uma cena, baseada no espaço cartesiano. As imagens pelas quais me interesso não se orientam pelo reconhecimento do contorno de um indivíduo, o que me faz considerá-las também antirretratos. Ao apresentarem esses sujeitos não humanos, em um olhar aproximado e voltado para a multiplicidade, para o grupo – recusando o olhar ocidental que se estrutura tanto no retrato, quanto na paisagem, ambos baseados na tomada de distância e no recorte –, essas pinturas deslocam a ênfase do indivíduo para a relação, alterando nossa escala de apreensão da realidade. Afinal, é impossível pensar o mundo, o clima ou a ciência sem considerar um campo relacional, no qual tudo se comunica, interage e se afeta mutuamente.
Lembro-me do acontecimento silencioso, porém revelador, que me levou a fazer uma das minhas primeiras pinturas. Ao abrir a geladeira e encontrar algumas frutas reunidas em um prato, tive a sensação súbita de interromper uma conversa. Lembro-me também de realizar uma série de poemas e aquarelas que atribuíam humores e sentimentos às frutas e outros objetos.
Anos mais tarde me dei conta desse fio condutor sempre presente em meu trabalho: embora trabalhe com uma linguagem visual, interesso-me pelo que não é visível naquilo que vejo, tanto pelos sabores, aromas, texturas quanto por uma dimensão imaterial que se aproxima do que chamamos de “alma”. Essa relação animista com o mundo tensiona a separação estanque entre sujeito e objeto, que fundamenta parte da ciência moderna e se encontra na origem de uma relação extrativista com o mundo natural. Através da pintura, busco construir uma simetria na qual os seres representados possam se apresentar como sujeitos, inspirada tanto pelos saberes dos povos originários como pelo pensamento de figuras como Antônio Bispo dos Santos, Eduardo Viveiros de Castro, Bruno Latour, Isabelle Stengers e Phillipe Descola.